.silêncios.


.a luz alaranjada. é noite. fim de tarde de inverno. naquela escola de Seia lembro-me de nós. não me recordo dos traços do teu rosto. já não. e queria. queria tanto. eras mais alto que eu. magro. pálido. lembro as ligaduras nas mãos. e o sorriso. desfocado. o amor com que falavas da Inês. da pequena Inês. sempre achei que era por isso que me eras mais próximo. ou talvez não. mas eras. e o cimento na noite iluminado pelos candeeiros luz laranja naquela noite fria na serra são intemporais. a conversa. tu sem razões para viver. dizias. ou a única razão. morrer. eu sem entender. a tentar resgatar-te. nessa noite. o abismo. mas voltámos. um dia. manhã. faltaste. entreolhamo-nos com preocupação. esperámos. te. desde esse dia. manhã. não voltaste a te sentar ao meu lado. a palidez eternizou-se noutros tons. tu deitado. finalmente em paz como querias. será que era isso que querias? nunca entendi. não te entendi. nunca esqueci. não te esqueci. não voltei a entrar num cemitério. nem em funerais. não voltei a ouvir a terra a cair. o som compacto da terra. e os soluços de morte. da ausência. mas era nova. tão novos éramos. e tantos anos faltavam. assim quero crer. à distância de 20 anos. abraço-te uma última vez. outra vez.
Até sempre Marcos.