.conversas.

(para ler a duas vozes, com falsete se faz favor)

Estás bem?
Sim
Pensei...
Pensaste
Sim, que mudaste
Sou a mesma
Não te conheço
As linhas mudaram
Sem elas não sei o rumo
Estou aqui
Não te sinto
Vai-te embora
Quero ficar
Fica
Quero que voltes
Não
Volta
Não
Olha para mim
Sim
Sentes?
Sim
Então volta
Estou aqui
Quero-te
Também te quero
Gostas de mim?
Vai-te embora
Responde
Sai daqui
Vem
Não digas mais nada
Não
Estás bem?
Sim
Pensei...
Pensaste
Sim, mudaste-me
Vem
Vou
Ficas?
Sim

.voltei a reler isto escrito aqui há quatro anos de distância. é estranho reler 'coisas' nossas e no meio dessas 'coisas' noutras tantas não as reconhecermos como nossas. não é o caso desta. coisa. mas de outras. lembra-me uma frase de Pedro Paixão que me voltou a acompanhar nos últimos dias. dita assim "Ele precisava tanto de escrever como de apagar o que escrevia.". mas não apaga. não apago. e escrevo 'coisas'. vou escrevendo como débitos a cair qual gotas de chuva. e hoje choveu bastante. novamente a chuva. e o frio. aqui escritos. anotados como quem debita. sem debitar. frases de café e elevadores que sobem. quando descem não se conversa. tem-se pressa. sempre a pressa. de ir.

.da quantificação.




.temos o hábito de "tempificar" tudo. na verdade. tudo se resume ao tempo. minutos, horas, anos, meses. e esse ser tão autónomo e controlador manipula rotinas. esse conceito criado algures no.... tempo. subjectivo. objectivo. abstracto. relativo. quantas vezes achamos que um momento foi demasiado longo. quantas vezes achamos que um momento foi demasiado curto. quase eternidade. quase efémero. um tudo ou nada. na verdade é um conceito. na verdade quantifica-se. segundos. pareceu um segundo. mas quantifica-se em dias. pareceu uma eternidade. aqueles minutos, segundos. como se o tempo tivesse parado. tic tac. o tempo não existe. mas existe. nos ponteiros dos relógios. nos números dos analógicos. no calendário. nos horários a cumprir. nas rotinas. mas não existe. numa qualquer realidade paralela que não o é. não existe. 5 anos é tanto. e tão pouco. para uma vida. um minuto é tão pouco (fumar um cigarro leva entre 3 a 5 minutos) e tanto (quando se espera pela hora de saída, quando se recebe más noticias mas não as más mesmo beras, que nessas o relógio pára). pára. o tempo não existe. conceito criado pela sociedade moderna que por ele se rege. e com a conceptualização deste vieram outros. e a banalização. de quase tudo. tudo. nada. mas quase. e depois de escrever estas balelas pareceu-me (mas só me pareceu) que passou um minuto. mas não. um cigarro extinguir-se-ia muito mais depressa. mas só porque me apetece vou tempificar conceptualmente o conceito abstracto da coisa em si. mas não digo. porque o tempo não é nada. quase. nada.

.do tempo.

.e de repente as noites são maiores. lá fora. em contraste com o que sinto. mais cinzento. e chuva. e frio. novamente o frio. e o sol tímido que se esconde. é escondido. e volto às mantas. e chocolates. bandas sonoras embalam espaços. a teimarem fazer da noite dia. mas como a noite já caiu. o som dos carros lá fora no piso molhado entra pelas frestas das persianas semi-cerradas. como a paz que vem silenciosa monocordicamente. embala.


.dos silêncios.

"Não sei a cor dos teus olhos, o som da tua voz, o toque da tua pele. Não conheço a tua idade, o lugar onde vives, de que te alimentas. Não posso adivinhar quem amas ou amaste, se sofres de alguma irrecuperável doença, quais as paisagens que preferes, que música ouves. Sei que espero todos os dias uma ou duas frases que me permitam continuar a respirar neste mundo."

Pedro Paixão

ponto vezes três


chove. demasiado. e o céu esta cinzento. demasiado cinzento. há nevoeiro. os dióspiros estão maduros. e apetece-me gelado. os chapéus de chuva pesam. incomodam. e atrapalham as gentes. desorientadas. parecem formigas. e chove demasiado não sei se já disse. mas chove. e o ceu está cinzento. e o vento. o vento demasiado. e parou de chover. e os sorrisos. acabou. o gelado. mas os dióspiros estão maduros. cheira a castanhas. e a São Martinho. e a um natal que chega demasiado cedo. demasiado. e tantas são as gentes. que correm. não há tempo. mas chove. e chove demasiado. não sei se já disse.